domingo, 10 de outubro de 2010


A estrada parecia interminável, cheia de curvas, buracos e poças de lama. O capim jovem se eriçava com o orvalho gelado que o sol baixo iluminava obliquamente, dando a impressão que os campos estavam cobertos de neve.
Acendi um cigarro e me distraí um pouco da direção, observando Maria que dormia a sono solto, apesar dos solavancos. Um buraco mais fundo que os outros me trouxe de volta à estrada de terra hostil que há duas horas palmilhávamos. Havia dirigido a noite inteira e o sono já me pregava peças. Meu olhar começou a sondar a planície em busca de um local para uma parada. Mas nada via, fora os pastos intermináveis e pequenos bosques aqui e ali.
Já me resignava a parar na estrada para cochilar quando algo me chamou atenção dentro de um arvoredo denso à nossa direita. Muros, colunas, uma casa.
Entrei no caminho mal-cuidado que serpenteava no bosque. Maria acordou quando paramos.
- Onde estamos? – Perguntou, estremunhada. Eu também não sabia. Um pátio rústico e arruinado nos cercava. Galpões sinistros escancaravam a goela em portas grandes e escuras. Desci do carro e me dirigi à casa grande daquela fazenda abandonada.
Mas nada havia na lúgubre construção além de aranhas, lacraus e tristezas antigas abandonadas pelos cantos. Um piso de cerâmica muito gasta era o que restava de milhares de passos. Maria estava adorando. Fumando um cigarro, percorria prazerosamente as salas vazias e os quartos onde ainda apodreciam alguns móveis.
Eu também estava estranhamente enfeitiçado com aquele palacete em decomposição. Podia sentir com nitidez algo das pessoas que ali habitaram. Algo de seus cheiros, de seus corpos havia ficado naquelas paredes e portas carcomidas. A presença daqueles seres desaparecidos ficava cada vez mais intensa.
Quando passamos em frente à porta de um cômodo escuro, senti um arrepio gélido percorrer minha espinha. Havia ou não havia visto aquilo?
- Vamos embora.
- Porquê? – Seu olhar era triste.
Nada respondi e voltei quase correndo para a segurança e o calor do carro. Maria me seguiu.
Quando retornamos à estrada o sol já ia alto e os campos verdejavam sob a brisa. 

sábado, 9 de outubro de 2010

ELEIÇÕES




ELES

Eles estão voltando,
não em silêncio
como o ladrão noturno,
mas reluzentes e confiantes
nos quartos coloridos
da mídia-bordel.

Eles estão voltando
com seus ternos impecáveis,
suas mentiras engatilhadas,
os dólares da gorjeta
no bolso do opróbio.

Eles estão voltando,
com suas contas nas ilhas,
seus títulos “honoris causa”,
as desculpas pelos desastres
 já redigidas nas gavetas.

Eles estão voltando,
como câncer recorrente,
como um vício deprimente
que um povo não quer deixar...


quarta-feira, 6 de outubro de 2010

ANGÚSTIA






A manhã surgiu entre os cacos afiados da noite.
Sei que cada minuto desse dia levará um pouco de mim.
Sei que cada momento é uma farpa, um espinho a mais.
Sei que no fim do dia, no fim de todos os dias,
O trinco de uma porta escura
Aguarda, sem pressa, a minha mão.


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Ouvindo: Desiderii Marginis
Imagem: Hidlight


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terça-feira, 5 de outubro de 2010



Então, depois da queda, o primeiro passo. À frente, o caminho com todas as suas possibilidades de luz e sombra....