Acendi um cigarro e me distraí um pouco da direção, observando Maria que dormia a sono solto, apesar dos solavancos. Um buraco mais fundo que os outros me trouxe de volta à estrada de terra hostil que há duas horas palmilhávamos. Havia dirigido a noite inteira e o sono já me pregava peças. Meu olhar começou a sondar a planície em busca de um local para uma parada. Mas nada via, fora os pastos intermináveis e pequenos bosques aqui e ali.
Já me resignava a parar na estrada para cochilar quando algo me chamou atenção dentro de um arvoredo denso à nossa direita. Muros, colunas, uma casa.
Entrei no caminho mal-cuidado que serpenteava no bosque. Maria acordou quando paramos.
- Onde estamos? – Perguntou, estremunhada. Eu também não sabia. Um pátio rústico e arruinado nos cercava. Galpões sinistros escancaravam a goela em portas grandes e escuras. Desci do carro e me dirigi à casa grande daquela fazenda abandonada.
Mas nada havia na lúgubre construção além de aranhas, lacraus e tristezas antigas abandonadas pelos cantos. Um piso de cerâmica muito gasta era o que restava de milhares de passos. Maria estava adorando. Fumando um cigarro, percorria prazerosamente as salas vazias e os quartos onde ainda apodreciam alguns móveis.
Eu também estava estranhamente enfeitiçado com aquele palacete em decomposição. Podia sentir com nitidez algo das pessoas que ali habitaram. Algo de seus cheiros, de seus corpos havia ficado naquelas paredes e portas carcomidas. A presença daqueles seres desaparecidos ficava cada vez mais intensa.
Quando passamos em frente à porta de um cômodo escuro, senti um arrepio gélido percorrer minha espinha. Havia ou não havia visto aquilo?
- Vamos embora.
- Porquê? – Seu olhar era triste.
Nada respondi e voltei quase correndo para a segurança e o calor do carro. Maria me seguiu.
Quando retornamos à estrada o sol já ia alto e os campos verdejavam sob a brisa.